A suspeita de que empresas beneficiadas com a renúncia fiscal da Prefeitura de Campo Grande não estão cumprindo com o Município a contrapartida que assumiram de gerar empregos em quantidades pré-definidas nos contratos, é uma das razões que motivaram a Câmara Municipal a realizar uma audiência pública para debater e propor soluções ao problema. A audiência, no último dia 12, deixou evidente que tanto as empresas como o prefeito Marquinhos Trad (PSD), as duas partes do contrato, são os responsáveis por mais esta sangria nas economias locais.
Foi um homem da mais elevada confiança do prefeito – Herbert Assunção, titular da Sedesc (Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico, Ciência e Tecnologia e Agronegócio) – quem confirmou os comentários e admitiu, durante a audiência sobre o Programa para Incentivos ao Desenvolvimento Econômico e Social (Prodes), que as cotas de empregabilidade não estão sendo oferecidas e, assim, não atendidas por essas empresas. Segundo Assunção, a contrapartida com a qual se comprometeram as empresas beneficiadas por incentivos fiscais do Prodes era gerar 3.131 empregos, mas não foram além dos 1,5 mil, cerca de 50% abaixo da meta.
Pouco mais de 220 investimentos contemplados com esses benefícios estão operando na capital. O secretário pondera que a crise econômica é forte justificativa que as empresas têm para o desempenho abaixo das cotas pré-estabelecidas. “Então, elas pedem aumento do prazo para que possam, gradualmente, gerar as vagas prometidas”, acentuou. “Recentemente, a Câmara aprovou um dispositivo com prazo maior, ampliado de quatro para seis anos”, disse. De acordo com ele, Marquinhos montou uma comissão para estudar a alteração do Prodes, com análises a cargo da Procuradoria-Geral do Município. “Parar de votar o programa talvez não seja a solução, porque afetaria muito o desenvolvimento da cidade”, conjectura.
POSICIONAMENTO
As argumentações do representante do prefeito foram ouvidas com atenção e interesse, mas não ficaram livres da contestação dos vereadores, que consideram irreversível a necessidade de promover mudanças no Prodes. Uma das atitudes cogitadas é a Câmara Municipal não votar qualquer projeto do Executivo sem que estejam redefinidos os dispositivos e a legislação que dispõem sobre a concessão de incentivos fiscais e intervenções semelhantes ao Prodes. O programa tem suas regras apreciadas e votadas pelo Legislativo.
Presidente da Comissão Permanente de Indústria, Comércio, Agricultura e Turismo, a vereadora Dharleng Campos (PP) é taxativa: os benefícios concedidos pelo Município têm sido maiores do que as contrapartidas apresentadas pelas empresas. Ela pontua essa desproporção: “Há empresas que geram três ou quatro empregos e ganham doação do terreno, desconto no IPTU, isenção do ISS e outros benefícios. Então, que as comissões de Constituição, Justiça e Redação e a de Finanças, além da nossa, avaliem esses projetos e decidam não mais conceder qualquer parecer enquanto essas regras não mudarem”, defendeu.
Ao endossar a manifestação da colega, o vereador Eduardo Romero (Rede) afirmou que este é um sentimento compartilhado por todos os integrantes da Casa. “Todos querem mudança nas regras. Só vamos considerar novos projetos a partir de uma nova legislação”, avisou. Outros vereadores salientaram que medidas de revisão já são frequentes nos debates e expedientes regimentais quando são votados projetos de autoria do Executivo para doação de imóveis públicos, redução ou isenção de tributos.
O debate, no Plenarinho da Câmara, já deixou marcada sua influência no círculo de relações entre os poderes por causa da excelência com que o Prodes é tratado pelas autoridades do Executivo e segmentos empresariais, a ponto de o prefeito Marquinhos Trad demonstrar parcimônia com a quebra de uma cláusula contratual importantíssima. Afinal, o quantitativo de vagas de trabalho prometidas pelos beneficiários do Prodes está – ou deveria estar – proporcionalmente associado ao custo-benefício do Município na pauta de renúncia fiscal.
Isso justifica o interesse dos núcleos mais influentes da economia e da política locais nesse debate. A audiência no Legislativo deu um demonstrativo disso, reunindo representantes do Conselho de Desenvolvimento Econômico de Campo Grande (Codecon), Conselho Regional de Economia, Conselho Regional de Administração, Sedesc e Conselho de Reitores de Instituições de Ensino Superior de Mato Grosso do Sul. A audiência atraiu lideranças comunitárias, classistas e vários vereadores, entre os quais Dharleng Campos, Odilon de Oliveira (PDT), Vinicius Siqueira (DEM), Eduardo Romero (Rede), Chiquinho Telles (DEM) e Dr. Loester de Oliveira (MDB).