A fama de “tocador de obras” acompanhou André Puccinelli (MDB) desde que se elegeu pela primeira vez prefeito de Campo Grande, em 1996. Naquele pleito, ele venceu no segundo turno o adversário Zeca do PT por apenas 411 votos, um resultado até hoje contestado. No ano 2000 Puccinelli se reelegeu sem muito esforço, já com o epíteto de empreendedor colado em seu perfil político.
Foi com esse carimbo que ele ganhou também duas eleições para o governo de Mato Grosso do Sul. E foi assim, nestes quatro ciclos executivos, que ele formou o seu círculo de aliados e nele escolheu os parceiros de um pequeno núcleo que iria operar o “lado B” da gestão pública – o lado em que o privado se confundiria com o público para ativar um dreno financeiro bastante rentável.
De acordo com a Polícia Federal, o núcleo em que atuavam os investigados da Lama Asfáltica tinha seus operadores para tarefas específicas, todos sob o comando de uma voz central e onipresente; a de Puccinelli. João Amorim e João Baird eram os operadores empresariais. Construção civil, informática e compras governamentais eram os negócios de uso mais recorrente para manobras que iam desde a garimpagem de obras milionárias até chegar aos processos de licitação e até de subempreita.
Dentro do governo o esquema tinha o sustento de legalidade financeira, técnica e fiscal entregue a homens de confiança, entre os quais os secretários de Infraestrutura, Edson Giroto, e de Fazenda, André Luiz Cance, além de outros em escalões inferiores, mas com alcance decisivo, como Wilson Roberto Mariano, que comandava a Agência de Gestão de Empreendimentos (Agesul).
Desse trio, Giroto foi quem mais ganhou visibilidade. Era secretário de Obras da Prefeitura na gestão de Puccinelli e ocupou cargo semelhante no Governo. Com André Puccinelli de “padrinho”, venturou-se na política. Candidatou-se a prefeito em 2012 e foi derrotado no segundo turno por Alcides Bernal (PP). Porém, alcançou uma posição importante na política: foi eleito deputado federal, mas não se candidatou à reeleição. Os percalços criminais interromperam sua trajetória.
Fora do governo, atuavam também outros braços empresariais para ampliar o sistema de drenagem financeira, entre os quais a Alvorada Gráfica e Editora, de Mirched Jaffar Jr, e a PSG Informática, em nome de Antonio Celso Cortez. Em uma das operações, segundo a PF, o governador Puccinelli acelerou uma transação totalmente irregular para garantir a confecção e a compra de livros da Gráfica Alvorada, já no final do seu mandato e sem qualquer necessidade justificada. Uma das conversas entre o governador e os operadores acertando o negócio foi gravada e divulgada pela força-tarefa da Lama Asfáltica.
A operação teve sua primeira etapa deflagrada em julho de 2015. Além da PF, agentes da CGU (Controladoria Geral da União) e da Receita Federal trabalharam nas apurações. As outras cinco etapas da operação investigaram a compra de fazendas com recursos desviados (Fazendas de Lama) e também aviões (Aviões de Lama). A PF também investigou o uso de empreiteiras (Máquinas de Lama) e ainda a compra de livros e contratação de serviços do Instituto Ícone (Papiros de Lama) para lavar dinheiro. Os prejuízos causados ao erário, somadas as seis fases da operação, passam dos R$ 432 milhões. Os cálculos são da PF e ainda não foram finalizados.