O ex-governador André Puccinelli (MDB) não deve sair tão cedo do buraco em que se encontra desde que o Ministério Público Federal o denunciou como líder de um esquema criminoso de desvio de verbas públicas e outros delitos. Na última quinta-feira (22), o Tribunal Regional Federal da 3ª Região publicou o indeferimento de uma petição do MPF para o emedebista responder o processo na Justiça Federal. O TRF-3 negou, mas manteve a ação processual correndo em âmbito estadual, no Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul.
Com isso, Puccinelli e mais nove pessoas – parte de um grupo ainda maior que atuou no bilionário esquema de licitações fraudulentas durante seus dois mandatos no governo estadual – permanecem no centro das investigações do caso conhecido como “Lama Asfáltica”. Esse nome foi dado à operação de uma força-tarefa que descobriu casos de corrupção em compras governamentais e contratos para obras de infraestrutura no Estado.
A pedido do MPF, a investigação começou a ser feita em corte julgadora federal. Porém, no ano passado a 5ª Turma do TRF-3 decidiu que competiria à justiça estadual assumir a responsabilidade processual, por entender que até aquele momento não havia indícios de que as práticas denunciadas causaram prejuízos à União. O único item da ação processual que permaneceu na justiça federal é o que apura a participação de um empresário, Ivanildo Miranda, que fez acordo de delação premiada na Lama Asfáltica.
Na investigação sobre corrupção passiva e lavagem de dinheiro, crimes que foram relacionados à concessão de benefícios fiscais do governo Puccinelli para o Frigorífico JBS, a força-tarefa ouviu dos acusados que de 2007 a 2015 correu uma série de propinas, por meio de notas fiscais fraudadas, e que o dinheiro foi pago em espécie e até justificado como doação para campanhas eleitorais.
OS INVESTIGADOS
Entre os denunciados, além do ex-governador estão o filho dele, o advogado André Puccineli Junior; o ex-secretário estadual de Fazenda, André Luiz Cance; o empresário João Alberto Amorim, dono da empreiteira Proteco; sua secretária e sócia, Elza Cristina; o advogado João Paulo Calves, suspeito de atuar como “testa de ferro” de Puccinelli Junior no Instituto Ìcone; os empresários Jodascil Gonçalves Lopes, Mirched Jafar Junior, João Roberto Baird e Antônio Celso Cortez, além do pecuarista Ivanildo Miranda, que fez acordo de colaboração premiada.
Na Justiça Estadual, o andamento mais recente do caso ocorreu em dezembro, quando o juiz Roberto Ferreira Filho, da 1ª Vara Criminal Residual de Campo Grande, autorizou o desbloqueio de R$ 18,5 mil mensais de André Puccinelli, exclusivamente para despesas pessoais. Todos os investigados passaram por situações constrangedoras, como os dias vividos na prisão, os mandados de busca em residências e escritórios e até o uso de tornozeleira eletrônica, que o ex-governador carregou durante alguns dias. Um dos últimos a sair da cadeia foi Puccinelli.
O AFILHADO
Quem continua preso até hoje, e por conta de outra parte das investigações, é o ex-deputado federal e ex-secretário estadual de Infraestrutura, Edson Giroto, tido como o mais próximo nas relações afetivas, políticas e no esquema de Puccinelli. Esta ligação começou na política, ficou mais forte no ambiente do poder público e acabou virando pó quando a Polícia, o Ministério Público, o Judiciário e os carcereiros entraram em cena.
Se a vontade acalentada por Puccinelli fosse endossada pelos eleitores, Giroto teria ido além do mandato de deputado federal. Foi com seu empurrão, numa campanha milionária e jogando todo seu peso político e eleitoral, que em 2010 Giroto se elegeu deputado federal. Em 2012, desrespeitando a vontade de seu partido e degolando todas as pré-candidaturas dos correligionários, Puccinelli enfiou Giroto goela abaixo do MDB para fazê-lo candidato a prefeito. Queria que ele fosse o sucessor de Nelsinho Trad. O eleitor, porém, não deixou.
O candidato do ex-governador ainda conseguiu ir para o segundo turno, mas foi batido por um radialista, Alcides Bernal, que mesmo sendo popular era considerado um azarão nessa disputa. Abalado por ter sofrido sua primeira grande derrota como “cabo eleitoral” e pelo impacto negativo que o fracasso causou ao PMDB em todo o Estado, Puccinelli fez Giroto afastar-se da Câmara dos Deputados para novamente ser nomeado na Secretaria de Infraestrutura. Quando o governo terminou, ambos já estavam no foco das graves suspeitas do MP.
NEGANDO
Desde as primeiras denúncias que sofreu, quando ainda estava no Governo, André Puccinelli nega com veemência as acusações do Ministério Público. Ele e os demais investigados já se manifestaram, ou afiançaram por meio de advogados, que são inocentes, que nada devem e confiam no discernimento da Justiça.
A denúncia de Ivanildo Miranda é considerada uma das mais demolidoras, por tratar-se de um empresário forte e muito bem relacionado. De igual forma, devastadoras também seriam as revelações de outros personagens do esquema, segundo o MPF, como André Cance, os empresários João Amorim, Mirched Jafar e João Baird. Por essas mãos já passou uma fortuna ainda difícil de ser calculada com exatidão, mas pode ser avaliada em torno dos R$ 1,5 bilhão.
PROJETOS DEMOLIDOS
A menos que ocorra uma excepcional reviravolta nas urnas, a tendência do MDB sul-mato-grossense nas próximas disputas eleitorais é cair no mais fundo do poço. O peso da desmoralização que atingiu seu nome de maior força política e inserção popular tornou-se um fardo tão insustentável que o partido pode até ficar sem lançar candidatos a prefeito em diversos municípios, alguns aonde já deteve a hegemonia no Executivo e no Legislativo.
Em Campo Grande está o mais destacado demonstrativo do desmonte partidário do MDB. Sem Puccinelli, desgastado, e Giroto, preso, restariam ao partido alternativas que não empolgariam suas bases e o próprio eleitorado. O único parlamentar federal é a senadora Simone Tebet, que já declarou estar fora de cogitação na briga sucessória. Dos três deputados estaduais, só um, Márcio Fernandes, tem domicílio eleitoral na cidade. Ele está numa conta de opções que tem o ex-senador Waldemir Moka e a ex-secretária de Assistência Social, Tânia Garib.
Se lançar candidatura majoritária na capital, o MDB corre o indiscutível risco de sofrer uma das mais humilhantes derrotas eleitorais da legenda em todo o País. Há uma opção honrosa e menos traumática, mas de efeito duvidoso, que seria indicar o vice de uma candidatura competitiva e acreditada. Resta saber se os emedebistas conseguiriam achar siglas interessadas que tenham esse perfil.
A última saída é entrar nas eleições disputando somente as vagas da Câmara de Vereadores. Em suma, o futuro não é dos mais alentadores e aquele que já foi o maior partido político do País pode estar indo para o matadouro eleitoral para sofrer o revés mais doído e melancólico já aplicados pelas urnas. Tudo porque seu principal líder e dirigente, que tantas glórias patrocinou nos tempos de vacas gordas, desandou fundo e agora é quem joga a pá de cal no túmulo do MDB.