Aceitar a tese de que seria ilegal o afastamento de Dilma é admitir que o STF participaria de uma ação de cunho político contra princípios da Constituição.
Na estratégia de defesa e nas ações de agitação e propaganda do PT e de uma presidente acuada no Planalto, a palavra “golpe” ganha grande relevância. “Golpe” é curto, fácil de pronunciar e adequado para ser gritado em manifestações — mas nada tem a ver com a crise política por que passa o país, na qual estão atolados PT e Dilma, e muito menos com o processo de impeachment da presidente em tramitação na Câmara.
O partido se encalacra a cada avanço da Lava Jato, e ontem a presidente sofreu derrota emblemática, com a formalização pelo PMDB da saída da base do governo. Deve puxar uma fila de novas defecções, porque político, em geral, não gosta de ser sócio de derrocadas.
À medida que a campanha pelo impedimento crescia e o juiz Sérgio Moro, com a força- tarefa da Lava- Jato, se aproximava do ex- presidente Lula, a militância criou termos paradoxais, como “golpe constitucional”. Ora, se é golpe, não pode ser constitucional.
PT e aliados marcaram para amanhã, 31 de março, manifestações em defesa do governo e, por óbvio, farão referência ao golpe dado pelos militares, apoiados pelas classes média e alta, há 52 anos.
Pura manipulação, porque o Brasil de 2016 nada tem a ver com o de 1964. A Lava- Jato, em que atuam de maneira coordenada a Justiça, o Ministério Público e a Polícia Federal, trabalha sem atropelos constitucionais. E quando a defesa considera haver alguma ilegalidade recorre às devidas instâncias judiciais. Se não tem conseguido muitos êxitos é pela solidez das provas e pelos argumentos do juiz Sérgio Moro. Equivocam-se, então, os que enxergam uma conspiração antidemocrática no combate à corrupção.
Já o processo de impeachment de Dilma, por sua vez, transita pelas instituições sem ilegalidades. Em 64 seria diferente. Acreditar no conto da carochinha do “golpe” é aceitar como verdadeiro o conluio do Supremo numa operação para defenestrar por vias ilegais Dilma do Planalto. Só numa alucinação. Vários ministros da Corte já negaram esta ideia tresloucada: seu presidente, Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia, Luís Roberto Barroso, Celso de Mello, por exemplo. Prova irrefutável da institucionalidade do impeachment é que seu rito foi estabelecido pelo próprio STF, com base naquele seguido contra Collor, em 1992.
Em 1964, houve ruptura institucional, com o esmagamento, pelos militares, das instituições. O golpe farsesco convence apenas desinformados e ingênuos, serve tão- somente aos mal- intencionados — estes, sim, golpistas — que desejam envolver numa espessa nuvem de fumaça as provas e as evidências de grossa corrupção que envolve quadros petistas.
Aceite quem quiser que políticas de supostos benefícios aos pobres podem justificar a roubalheira. Não num país com instituições republicanas sólidas. (Editorial do jornal O Globo)