Trabalhadores correm o risco de audiência sobre abusos da prefeita não ter sido mais que um passeio no Legislativo
A audiência publica de segunda-feira, 1º, na Câmara Municipal, para debater a atitude da prefeita Adriane Lopes (PP) de descumprir as leis que a obrigam a pagar direitos salariais dos servidores, pode não alcançar efeitos práticos a curto prazo. Convocada pela Comissão Permanente de Controle da Eficácia Legislativa, a audiência reuniu vereadores e representantes das diversas categorias do funcionalismo.
Embora os membros do colegiado cobrem a obediência às leis, a prefeita tem maioria no Legislativo para manter as coisas como estão – o que vem acontecendo desde o início desta gestão, que começou em 2017 com o prefeito Marquinhos Trad e teve continuidade com sua vice, Adriane. Para melhor compreensão do sistema de arrocho salarial e desvalorização dos servidores, fatos significativos alinham-se nestes sete anos e meio, um deles levantado há um ano.
No dia 15 de março de 2023, quando Adriane Lopes já somava 11 meses no poder, o advogado Márcio Almeida, presidente da Comissão de Direito Sindical da OAB-MS, revelou à Rádio CBN a existência de um aumento não identificado na folha de pagamento dos servidores municipais. Ele disse na época que o repasse misterioso já fazia parte da prestação de contas da prefeitura nos últimos quatro anos – portanto, desde a gestão de Marquinhos – e que se apurou um reajuste de 25% nos gastos com a folha.
“Queremos que a Câmara adote medidas dentro de sua prerrogativa legal”, afirmou o advogado dos sindicatos, Márcio Almeida.
REPASSE MISTERIOSO
Por monitorar em mais de 10 anos os dados públicos da gestão fiscal do município, Almeida estranhou a descoberta. E viu que desde 2019 uma parcela do dinheiro destinado ao pagamento de pessoal não tinha qualquer comprovante publico da origem e do destino do repasse. Calculou-se, então, que o total de pagamentos não demonstrados giraria em torno de R$ 46 milhões/mês, o que resultaria em R$ 556 milhões no ano, um “excesso assombroso.
Na ocasião, Almeida cobrou: “É uma explicação que o poder público precisa dar à Câmara e à sociedade”. Por enquanto, a cobrança é inócua. Adriane deve supor que não tenha satisfações a dar a ninguém ou que pode continuar ludibriando a sociedade. É quase impossível explicar porque as finanças da prefeitura estão no abismo, os serviços básicos um caos e as gastanças, até com folha secreta, bancando o rendimento de privilegiados lotados sem concurso nos cargos (políticos) de confiança.
A AUDIÊNCIA
Agora, um ano depois, a Câmara volta ao centro das atenções, diante de trabalhadores publicos desconfiados e receosos de continuarem vítimas de um círculo vicioso. Afinal, todos que foram à audiência sabiam que até ali a prefeita, além da maioria acabrestada vedando o papel fiscalizador do poder, ainda conta com a condescendência ou a omissão dos órgãos de controle, como o Tribunal de Contas e o Ministério Publico. Nenhum dos três (Câmara, TCE e MP) conseguiu convencer ou obrigar a prefeita, de acordo com suas atribuições, a cumprir as leis.
A audiência foi presidida pelo Professor Juari, que tinha a seu lado os vereadores Luiza Ribeiro e Claudinho Serra. Eles exigiram o cumprimento dos dispositivos que asseguram o direito do funcionalismo a melhorias como a insalubridade, reposições salariais e melhores condições de trabalho. Os guardas municipais e enfermeiros, que ficaram mobilizados duas semanas à espera, em vão, de uma resposta da prefeita, acentuaram o coro vigoroso da insatisfação.
COBRANÇAS
“Queremos que a Câmara adote medidas dentro de sua prerrogativa legal”, afirmou o advogado dos sindicatos, Márcio Almeida. “Desde que a prefeita assumiu temos dificuldade em estabelecer diálogo. Estamos aqui pedindo apoio da Casa. É inadmissível que leis sejam construídas, votadas e jogadas ao lixo”, emendou Ângelo Macedo, presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Enfermagem.
Para o presidente do Sindicato dos Guardas Municipais, Hudson Bonfim, o desgoverno é total. “Nós, trabalhadores, somos a engrenagem mais importante do município. Nossos direitos devem ser atendidos. É absurdo o que acontece, apenas Campo Grande não paga periculosidade aos guardas”, observou.
Por sua vez, Lílian Fernandes, presidente da Feserp/MS (Federação dos Servidores Públicos Estaduais e Municipais), questiona: “Temos que brigar novamente para que se cumpra a lei. Quando não se tem diálogo, não se tem mais nada. Dia 04 [de abril] é o prazo final da revisão geral anual. O que a prefeita tem a dizer”?