A Santa Casa de Campo Grande enfrenta uma crise sem precedentes, com falta de insumos para cirurgias e superlotação. Diante do agravamento da situação, médicos do setor de ortopedia procuraram a polícia ontem (25/03) para denunciar a falta de condições de trabalho e alertar que 70 pacientes estão sob risco de morte ou sequelas graves.


Acompanhados de um advogado, três médicos registraram um boletim de ocorrência relatando a indisponibilidade de materiais ortopédicos essenciais para cirurgias de urgência e emergência. O chefe do setor de ortopedia da Santa Casa, Dr. João Antônio Pereira Mateus, enfatizou que o hospital está em colapso e que a falta de insumos compromete a vida dos pacientes.
Mesmo com um ofício emitido na segunda-feira (24/03) alertando para a superlotação, novos pacientes continuam chegando, sobrecarregando ainda mais a unidade. Segundo os médicos, a crise é resultado de débitos acumulados da instituição com fornecedores, afetando não apenas a ortopedia, mas também outros setores do hospital.
Déficit de R$ 13 milhões por mês
Uma audiência pública realizada no dia 17 de março na Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul debateu a crise enfrentada pela Santa Casa e demais hospitais filantrópicos. Na ocasião, documentos apresentados pela instituição revelaram um déficit mensal de R$ 13,23 milhões, totalizando uma dívida anual de R$ 158,85 milhões.
A direção da Santa Casa alega que não houve reajuste financeiro desde 2022, gerando um desequilíbrio econômico que culminou na crise atual. O contrato com a prefeitura de Campo Grande expirou em 2024 e ainda está em processo de renegociação.
Na tentativa de aliviar a crise, o hospital obteve na Justiça a liberação emergencial de R$ 46 milhões. No entanto, a Santa Casa afirma que os problemas financeiros persistem, com risco iminente de paralisação total dos atendimentos. Parte dessa situação também decorre do não recebimento de repasses federais destinados à saúde durante a pandemia de Covid-19 em 2020, cujo recurso ainda está em análise no Superior Tribunal de Justiça (STJ).
CRM-MS exige medidas urgentes
O Conselho Regional de Medicina de Mato Grosso do Sul (CRM-MS) manifestou preocupação com a situação crítica da Santa Casa. Em nota oficial, o presidente do CRM-MS, Carlos Idelmar de Campos Barbosa, destacou a necessidade de providências imediatas para garantir um atendimento adequado aos pacientes. O conselho afirma que está em contato com gestores da saúde e diretores do hospital para buscar soluções efetivas.
Falta de leitos agrava a situação
A crise hospitalar em Mato Grosso do Sul se intensifica anualmente na segunda quinzena de março, com unidades de saúde lotadas, falta de leitos de UTI e sobrecarga nos atendimentos de emergência. Atualmente, há apenas um leito hospitalar para cada 607 habitantes no estado, um número muito inferior ao recomendado pela OMS, que é de 3 a 5 leitos por mil habitantes.
Dados do Ministério da Saúde indicam que Mato Grosso do Sul possui 6.690 leitos hospitalares, dos quais 4.556 são destinados ao atendimento público pelo SUS. Especialistas apontam que a falta de um hospital público municipal em Campo Grande contribui para a sobrecarga da Santa Casa, do Hospital Regional e do Hospital Universitário, forçando as UPAs e CRS a assumirem uma demanda excessiva de pacientes.
Diante desse cenário, profissionais da saúde e autoridades cobram medidas urgentes para evitar um colapso total no sistema de saúde pública do estado.
Juiz manda prefeitura pagar à Santa Casa R$ 46 milhões em 48 horas
Entidade filantrópica recorreu à Justiça para receber repasses da pandemia de covid-19
A Santa Casa de Campo Grande entrou na Justiça para garantir R$ 46.381.533,60 oriundos da Prefeitura de Campo Grande e o pedido de tutela de urgência, protocolado na segunda-feira (24/03) à noite, foi acolhido e determinado o depósito em 48 horas sob risco de bloqueio do valor das contas públicas.
O dinheiro contestado envolve a falta de repasses federais enviados durante a pandemia de covid-19 em 2020. Nos autos processuais, o hospital alega dificuldades financeiras e risco de interrupção dos atendimentos.
À imprensa, a entidade filantrópica afirma atuar há anos sob subfinanciamento, sendo responsável por mais da metade dos atendimentos hospitalares qualificados em Campo Grande. “Reiteramos nosso compromisso com a promoção da saúde e direitos fundamentais, e informamos que procedimentos relacionados aos fatos mencionados já estão em análise junto ao Ministério Público”, diz o comunicado.
O juiz que recebeu o pedido, Marcelo Andrade Campos Silva, da 3ª Vara de Fazenda Pública, apontou não ter a competência para o caso, porque estava ligado a outra ação, distribuída em 2020 e que tramitou na 1ª Vara de Fazenda. Entretanto, pontuou que via presentes requisitos para concessão da tutela e determinou à prefeitura que efetue o pagamento, além de mandar que o processo seja remetido à outra vara.
Entenda – Segunda-feira (24/03), o principal hospital de Campo Grande divulgou ofício em que pede para não receber mais pacientes regulados pelas unidades básicas e de pronto socorro. O motivo divulgado pela diretoria do hospital é a situação “caótica” de superlotação, principalmente no pronto-socorro, que, de acordo com a nota, tem capacidade para 13 pacientes, mas atualmente estaria comportando 80.
A Sesau (Secretaria Municipal de Saúde Pública) enviou uma nota informando que está implementando um conjunto de medidas emergenciais para enfrentar a superlotação nas unidades de urgência e emergência, que operam em estado de capacidade plena.
A secretaria ainda alegou que não tem dívida alguma com a Santa Casa. Além disso, reforça ainda sobre a importância de a população procurar o atendimento adequado conforme a gravidade do caso, garantindo um fluxo mais eficiente e reduzindo a sobrecarga nas unidades de urgência e emergência.