A queda-de-braço estava anunciada e as partes preparavam suas armas. Na verdade, o repto do presidente Jair Bolsonaro para que os governadores abrissem mão do ICMS do combustível para forçar a redução do preço nas bombas era uma bravata. E os governadores perceberam – um dos primeiros a fazer o alerta foi o de Mato Grosso do Sul, Reinaldo Azambuja.
O desafio do presidente, jogando a responsabilidade exclusivamente no lombo dos governadores, foi imediatamente respondido. Além de não ter condições imediatas de abrir mão da arrecadação do ICMS, Azambuja salientou que os estados não podem praticar a renúncia de receita, sob pena de incorrer em crime administrativo em grave desobediência à Lei de Responsabilidade Fiscal. Não obstante, devolveu a provocação presidencial na mesma moeda, sugerindo que o Planalto também zerasse os impostos federais nos estados.
Segundo a imprensa, o governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), cujo partido é o mais fiel a Bolsonaro na Câmara em votações no campo econômico, assinalou: “Sou a favor da redução de impostos, mas não sou irresponsável”. Todos os estados, em maior ou menor grau, enfrentam problemas fiscais, e a perda de receita iria complicar ainda mais a situação.
Em mais uma intervenção desastrada – e de inconcebível deselegância para com os chefes de executivos estaduais -, o presidente acendeu um rastilho que pode chegar ao pavio congressual. O senador de oposição Randolfe Rodrigues (Rede-AP) não perdeu tempo: apresentou um projeto para zerar todos os impostos federais que incidem sobre os combustíveis. A proposta de Randolfe pode levar os governistas a ter de se posicionar contra a ideia maluca de Bolsonaro.
O papel republicano e de magistrado foi cumprido por Azambuja e demonstrou, na prática, que Mato Grosso do Sul é gerido com responsabilidade. Não há medidas que procurem os aplausos fáceis e imediatistas da plateia. Há, isto sim, posicionamento de quem governa com autoridade, planeja estrategicamente as ações do Estado e, acima de tudo, é responsável pela preservação do interesse público.
Atender à provocação de um presidente que quer todos rastejando a seus pés não faz parte das obrigações e atitudes de qualquer governante de fato e de direito antenado com os legítimos clamores da sociedade. Se o presidente pensasse antes de falar – algo que não costuma fazer em sua trajetória política – certamente sopesaria prós e contras, avaliaria o custo-benefício de decisões populistas, demagógicas, sopradas pelos ventos do imediatismo.
O governo sul-mato-grossense fez o caminho contrário do governante do País, porque avaliou, com precisão e cuidado, os impactos que o Estado teria na hipótese de abrir mão da receita do imposto dos combustíveis. Cairia por terra grande parcela das conquistas e avanços alcançados nos últimos cinco anos, como o pagamento em dia dos mais de 75 mil servidores públicos – ou cerca de 420 mil pessoas que, recebendo nas datas pré-estabelecidas, movimentam a imensa cadeia da economia, gerando novos empregos e conservando os existentes, aquecendo as diversas atividades e impedindo que a crise faça lugar cativo por estas paragens.
Que o presidente Jair Bolsonaro repense e reavalie seus reptos e a forma com a qual se dirige aos governadores, tentando deixá-los em maus lençóis com a opinião pública. Antes, deveria explicar à sociedade que o governo federal, do qual é o chefe maior, patrocina uma das maiores sobrecargas tributárias já impostas aos cidadãos e cidadãs de um país.
GERALDO SILVA