A insatisfação nacional com a barbeiragem descomunal do governo federal no combate e prevenção à Covid-19 chega ao ápice com a previsível crise na campanha nacional de imunização. Não apenas pelo esvaziamento dos estoques, mas por todo o conjunto da obra que opera tal desastre.
Brasil, 17 de fevereiro de 2021. Até essa data, nas contas do coronavírus, o País trazia o luto por 242.090 mortos e abrigava 9,97 milhões de pessoas contaminadas, enquanto 8,9 milhões conseguiram se recuperar e 786,2 mil eram mantidos sob tratamento.
Mesmo que as mortes e contaminações não pudessem ser freadas totalmente desde abril do ano passado, quando teve início a calamidade, nesse período teria sido possível evitar o tamanho da tragédia. Contudo, faltou ao Brasil o comando seguro e humanista de uma liderança preparada, sensível, humilde e, sobretudo, sensata.
Foi a ausência de lucidez e de sensibilidade que fez o presidente da República passar ao largo da pandemia, reduzindo-a, com devaneios e sarcasmos, às dimensões estreitas de uma “gripezinha”. O governante da Nação não preparou nem preveniu os seus governados. Ao contrário: empenhou sua influência junto à imensa parcela de seguidores para instalar a narrativa negacionista e anticientífica de desconstrução da letalidade pandêmica.
O Planalto andou na contramão da crise. O presidente pisou na voz científica, achou solução em medicamentos sem eficácia comprovada e torrou bilhões de verba pública para adquiri-los. Enquanto isso, o restante do mundo andava no trilho firme e historicamente reconhecido da sensatez, da inteligência, agarrando-se à esperança que só a Ciência oferece como possibilidade humana.
Agora, com uma campanha de imunização mal organizada, povoada de falhas estruturais e desvios de toda ordem – inclusive de caráter, por alguns aproveitadores, a exemplo dos sangradores de verbas públicas e dos fura-filas -, o Brasil reclama a falta de vacinas suficientes. Não há doses sequer para completar a imunização dos grupos prioritários.
Cerca de 5,5 milhões de brasileiros foram vacinados. A segunda dose chegou para pouco mais de 350 mil pessoas. Para os especialistas, nesse ritmo vai demorar mais três anos para que toda a população seja imunizada. É muito tempo. São muitas vidas que não podem esperar.
As digitais do descaso presidencial estão coladas na crise. O general que chefia o Ministério da Saúde virou alvo até de governadores e prefeitos de todo o País, muitos da base de sustentação de Bolsonaro. Essas lideranças são vozes de 27 estados, do Distrito Federal e mais de 5.500 municípios. Cobram aquilo que faltou na pandemia e parece não ter existido em nenhum dia desta gestão: responsabilidade.