O Ministério Público Federal (MPF) em Mato Grosso do Sul denunciou quatro pessoas por envolvimento em um esquema de desvio de recursos públicos na Prefeitura de Ladário (MS) no ano de 2008. A ex-tesoureira, Ercileia Barboza, e o então prefeito, José Sampaio, já falecido, sacavam verbas da conta bancária do município, as depositavam no caixa da prefeitura e, em seguida, retiravam montantes a pretexto de pagar, em espécie, por serviços que, na realidade, nunca foram prestados.
A fraude foi descoberta após um cidadão ter caído na malha fina da Receita Federal, depois de a Prefeitura de Ladário ter lançado em seu CPF uma nota fiscal no valor de R$1.621 por um serviço de manutenção elétrica, que, segundo ele, jamais foi prestado. O rapaz, diante da situação suspeita, decidiu registrar um Boletim de Ocorrência (BO) e, para sua surpresa, logo depois foi procurado por servidor da prefeitura, que lhe pediu para retirar o BO, em troca do pagamento da diferença do imposto que a Receita Federal dizia ser devido.
Em razão disso, o cidadão procurou o Ministério Público Federal, que iniciou uma investigação e acabou descobrindo um esquema organizado de desvio de recursos públicos, estruturado a partir da emissão de notas fiscais fraudulentas que visavam a esconder a apropriação de valores então depositados no caixa da prefeitura.
Dinheiro vivo
Para que se tenha dimensão do esquema, apenas no último ano da gestão de José Sampaio, mais de R$ 1,5 milhão foram retirados da conta do Município, supostamente transferidos para o caixa da prefeitura, e retirado em seguida, na forma de “pagamentos” por serviços que, na verdade, ao que tudo indica, nunca foram prestados.
A prática de saques em espécie da conta do município de Ladário, insegura e incomum em tempos de transações virtuais, era conduzida pelo ex-prefeito e pela então tesoureira sem conhecimento dos contadores da prefeitura. Segundo depoimentos de servidores do município, não se sabia dos saques, nem de seu depósito no caixa, muito menos dos supostos pagamentos a fornecedores em “dinheiro vivo”.
Tais evidências contrariam os registros contábeis de saques e de pagamentos apresentados pela Prefeitura de Ladário em 2008 e denotam que diversos documentos (entre notas fiscais, notas de empenho etc.) eram fictícios, servindo apenas para dar aparente legalidade a operações de desvio de recursos públicos operada a partir do esquema apurado.
Outras evidências
De acordo com as investigações, as 15 pessoas jurídicas supostamente beneficiárias dos maiores pagamento em dezembro de 2008 estavam todas canceladas na época da emissão das notas fiscais relativas aos serviços por elas supostamente prestados. O MPF identificou até mesmo a compra de pneus, de uma empresa inexistente há mais de 10 anos, em benefício de um ônibus que já se encontrava, à época, em estado de sucata, sem qualquer condição de rodar.
O Ministério Público descobriu, ainda, que o ex-prefeito pedia a seus fornecedores notas fiscais não datadas, ao que tudo indica para simular pagamentos que ocultavam o desvio de recursos, e chegou a conseguir que um auxiliar de contabilidade furtasse folhas do talão de notas fiscais da empresa onde trabalhava, para auxiliar no esquema.
E as irregularidades continuam: as ordens de pagamento não eram assinadas pelos credores e a certificação de recebimento dos produtos e serviços, em muitos casos, era feita por carimbos que reproduziam a assinatura dos servidores, não atestando a origem da rubrica.
Em suma, segundo o MPF, “o que se nota é que muitos dos valores que, em tese, seriam destinados ao Caixa da Prefeitura para ‘pagamentos’ de fornecedores, na realidade nunca chegaram a seu destino, sendo, ao revés, desviados ou apropriados ”.
Para o órgão ministerial, são fortes as evidências de que, pelo esquema, Ercileia e José Sampaio se apropriaram destes recursos públicos, uma vez que, “segundo extratos bancários, imediatamente após ou no mesmo dia de alguns dos saques realizados na conta bancária da Prefeitura, valores foram depositados em contas bancárias de titularidade da ex-tesoureira, do então prefeito e de sua esposa”.
Responsabilidades
O auxiliar do escritório de contabilidade e um intermediário que colaboraram com o esquema – ao fornecer notas fiscais frias furtadas ao então prefeito para que ele usasse na falsa comprovação de serviços – devem responder penalmente por falsidade ideológica.
Já o ex-servidor, que inseriu declarações falsas e tentou mascará-las, e a ex-tesoureira, que arquitetou todo o esquema com o ex-prefeito, já falecido, devem responder por falsidade ideológica e peculato. As penas, somadas, podem chegar a 17 anos, além de multa. (Assessoria)