Hermanos não tiveram dificuldade para superar o algoz do Brasil; agora, esperam por França ou Marrocos
Parecia o mesmo roteiro do jogo do Brasil. A Croácia controlava no meio-campo, trocava passes, dominava a partida de intermediária à intermediária. Lionel Scaloni havia encorpado o meio-campo com Paredes e formou uma linha diante da área (vou resistir à tentação de dizer que era uma parede). Pela direita, De Paul, pela esquerda MacAllister, no meio Enzo Fernández e Paredes.
A Croácia vai bem até passar o grande círculo. Quando chega no ataque, falta. Kramaric tem uma fração de segundo de delay em relação ao time. No alto nível, isso significa que ele toca sempre na hora errada bola. Pasalic, que deveria estar com ele ou próximo, estava perdido no meio da marcação. E Juranovic, o lateral-direito que parecia um Carlos Alberto Torres croata na sexta-feira, quase criou raiz na defesa.
Só que, mesmo com essa dificuldade, a Croácia atingia seu objetivo, de amornar o jogo. Tanto que a torcida havia elevado o tom aos 10, cantando “Diego, Diego”, em homenagem a Maradona, e foi baixando, baixando, baixando o seu tom até que ficou só o argentino do bumbo. Algo até meio sorumbático para uma semifinal da Copa.
Só que se a estratégia de Zlatko Dalic era tirar a temperatura, a de Lionel Scaloni era a de esperar um vacilo dos croatas na troca de passes irritante deles. Modric, Brozovic e Kovacic parecem conectados na mesma rede de wi-fi. Estão sempre no mesmo ambiente, sempre se encontram. Aos 11, Brozovic errou. Mac Allister pensou em arrancar e foi derrubado. Logo depois, Lovren cabeceou a bola e a cabeça de Romero e Otamendi. Os dois ficaram caídos, e Lovren saiu com ar de quem comandava o jogo.
A torcida atrás de Dibu Martínez manjou a tática dos croatas e começou a cantar a pleno “Vamos, vamos, Argentina, vamos, vamos a ganhar”. O time respondeu. Enzo chutou de fora da área e obrigou Livakovic a salvar em dois tempos. Os argentinos trocaram a música nas cadeiras do Lusail, e o time aumentou a rotação. A Croácia escapou em lance individual de Kovacic. Foi preciso derrubar Kramaric para evitar o pior. O jogo estava equilibrado. Modric, aos 30, fez jogada individual e levantou aplausos.
Só que, três minutos depois, o mesmo Modric não interceptou o lançamento de Enzo. A bola chegou a Álvarez. Livakovic, o algoz dos brasileiros, saiu açodado e derrubou o atacante. Pênalti. Messi bateu forte, no alto. Sem chance. Era o 1 a 0.
O gol deu tilt nos croatas. Eles saíram para o ataque. Só que se esqueceram que não tem ataque. A Argentina esperou novo erro. E ele veio rapidamente. Álvarez se antecipou a um croata e arrancou da intermediária. Tocou e recebeu antes da linha do meio-campo. Dali, parou no gol. Parecia uma dessas caminhonetes que aceleram nas autobans aqui de Doha. Era o 2 a 0. Zlatko Dalic passou a mão na cabeça, ajustou a franja dividida ao meio, muito anos 1980, e certamente concluiu que seu plano tinha ido parar no meio do mar azul do Golfo Pérsico. Sem boia.
Dalic voltou com Orsic Vlasic nos lugares de Pasalic e Sosa. Aos cinco, trocou o volante Brozovic por Petkovic, o grandalhão do gol no Brasil. Passou a jogar com três na frente e a conceder espaços. A Argentina pegava a bola e trocava passes, encontrava espaços. Messi, aos 12, fez grande jogada, tabelou e chutou em cima de Livakovic. Aos 16, Scaloni decidiu fechar. Tirou Paredes e colocou Lisandro Martínez. Montou linha de cinco na defesa. Se defendia com ainda mais solidez, vigiava bem a bola aérea para Petkovic e, quando saía, liberava os laterais.
Só que, além dessa organização e da fibra, a Argentina tem um gênio. Aos 25, a bola veio da lateral. Álvarez fez o pivô e tocou para ele na direita. Ele foi para cima de Gvardiol. Pobre do guri. Aos 20 anos, Gvardiol aprendeu que, com Messi, ou tira a bola, ou faz a falta. Messi driblou, deu meia volta e, quando o croata de 1m85cm deu o bote, ele girou em direção ao fundo. Cruzou para Álvarez fazer 3 a 0. Cinco minutos depois, Scaloni já começou a tratar da final. De Paul, a alma desse time, e Álvarez saíram para Exequiel Palacios e Dybala, estreante na Copa.
Faltando 10 minutos para o final, Dalic trocou Modric por Majer, 24 anos, um clone seu (na aparência). Era a senha de que tudo tinha acabado para a Croácia. A torcida argentina, então, entoou com vigor: “Muchaaaaaaaacho, volvemos a nos ilusionaaaaaar”. Essa é a música mais ouvida aqui em Doha. No elevador, no metrô, nos restaurantes, nos Starbucks que parecem onipresentes em West Bay. Quando ela não está sendo cantada por alguém, é você que acaba cantando, de tão automático que se tornou. Assim, será até domingo (18), dia da final aqui neste mesmo Lusail. Eles voltaram a se ilusionar e vão buscar mesmo a terceira.