Levantamento feito com base nos dados da Pnad mostra que mais de 33 milhões de brasileiros recebiam um salário mínimo ou menos no final de 2021, o maior contingente da série histórica, que teve início em 2012.
Nos meses de janeiro, fevereiro e março, 11,1% dos trabalhadores brasileiros não conseguiram um emprego. Os números frios registram essa taxa como a menor desde 2016 para um primeiro trimestre, mas eles representam quase 12 milhões de desempregados. É mais do que toda a população de Portugal, e quase quatro vezes a população inteira do Uruguai.
Segundo o IBGE, a renda média dos trabalhadores diminuiu quase 9% na comparação anual. Em um primeiro trimestre, é a menor renda média registrada desde o início dessa forma de medição, em 2012. Essa queda na renda aparece em outro levantamento baseado nos dados do IBGE.
“Às vezes não tenho dois reais para comprar um pão”, diz a manicure Sandi Jenifer Soares.
Sandi ganhava R$ 350 por mês como manicure, mas o dinheiro não dava para alimentar os dois filhos e o enteado. “Carne está cara. É muito raro eu comer carne. A gente compra mais ovo, salsicha, hambúrguer”, conta.
Hoje, ela agarra cada oportunidade na unha. Esta semana, começou a trabalhar como ajudante de uma escola, e até mesmo ganhar o salário mínimo pode fazer a diferença. “Graças a Deus, eu consegui esse emprego. Ganhar um salário, tem que fazer milagre. Porque, de unha, hoje tem, amanhã não tem”, destaca.
Levantamento da consultoria IDados, feito com base nos dados da Pnad, mostra que mais de 33 milhões de brasileiros recebiam um salário mínimo ou menos no final de 2021. É o maior contingente da série histórica que teve início em 2012 e equivale a quase 35% dos brasileiros com ocupação.
A pesquisadora Ana Tereza Pires explica que 2021 foi um ano de retomada dos empregos perdidos na pandemia, mas com a economia ainda em dificuldades.
“As pessoas que retornaram ao mercado de trabalho encontraram condições de trabalho piores do que aquelas de quando elas tinham saído do mercado de trabalho. E, para além disso, aquelas pessoas que já estavam no mercado de trabalho também estão presas ali, na mesma remuneração que elas tinham há um tempo atrás, em um cenário de alta inflação e de baixa perspectiva de crescimento econômico”, explica.
Desde que saiu da casa dos pais, três anos atrás, Thais Araújo de Souza já fez de tudo para pagar as contas. Foi babá, faxineira e até animadora de festas. Depois de muita luta, em janeiro deste ano, aos 22 anos, conseguiu o melhor emprego que já teve na vida. Pela primeira vez, ela tem carteira assinada e recebe um salário mínimo. Auxiliar de serviços gerais em uma academia, Thais gasta metade do salário com aluguel.
“É difícil. É você pagar uma conta ali, você fazer aquele cálculo ali para ‘vou pagar isso, vou pagar aquilo’, para ver se sobra um dinheirinho a mais. É sempre ali na balança para ver o que vai dar, o que não vai dar. Mas é difícil”, não é fácil, lamenta.
O levantamento revela que o cenário é bem mais desafiador para os trabalhadores negros. Quatro em cada dez ganham o mínimo ou menos, enquanto apenas um quarto dos brancos recebe tão pouco.
Viver com o mínimo significa sonhar com o básico. Sandi diz que precisa arrumar a estrutura da casa, que ameaça ruir quando chove mais forte. “Eu não sei nem por onde começar, porque olha a minha situação”, afirma.
Já Thais sempre quis ser comissária de bordo; fez até um curso para ingressar na profissão. Por enquanto, o sonho é distante e a batalha pesada.
“Quando eu chegar lá, que eu estiver lá em cima voando, vou olhar para baixo e vou falar: ‘É, eu consegui’. Não foi fácil chegar até aqui, mas eu consegui’”, sonha.