Em 130 anos da abolição da escravatura, muito ainda precisa ser feito para diminuir as desigualdades sociais pelas quais os negros passam no Brasil, segundo os deputados estaduais Amarildo Cruz (PT) e João Grandão (PT), que ocuparam a tribuna da Assembleia Legislativa durante sessão marcada pelo Dia da Consciência Negra. A data foi instituída para lembrar a morte de Zumbi dos Palmares, líder do maior quilombo de resistência contra a escravidão.
Amarildo Cruz foi o primeiro a discursar, pedindo a todos que aproveitassem o dia para fazer uma reflexão sobre justiça social. “Esse é um dia de debate intensificado e profundo sobre a história de nosso país. Discutir sobre isso é papel de pessoas de bem pela democracia de oportunidades, que podem ajudar a cicatrizar as chagas deixadas pela escravidão. Foram mais de 300 anos de opressão e nosso país é racista sim. Não é questão de vitimizar, pois ninguém nasce racista, como disse [Nelson] Mandela, isso é ensinado, introjetado”, explicou.
Para o deputado, a política de cotas raciais foi a forma de dar instrumentos à dignidade, mesmo que transitoriamente. “Todas as leis e políticas no Brasil de antigamente beneficiaram os exploradores e isso refletiu na sociedade que somos hoje. Os negros sofrem esse reflexo também, pois são maioria nas periferias. Então que as cotas oportunizem o país a se retratar da desigualdade, enquanto for necessário, porque sabemos que não precisa ser para sempre”, destacou.
O parlamentar explicou o avanço que as cotas proporcionaram no acesso dos negros ao serviço público em Mato Grosso do Sul. Atualmente, 20% das vagas em concursos públicos no Estado são reservadas para negros, por força da Lei 4.900/2016. Amarildo Cruz (PT) foi autor da lei anterior, que resguardava 10% de vagas aos negros e foi ampliada pela nova legislação, que ainda determina que outros 3% das vagas sejam destinadas aos indígenas. Antes da Lei, Amarildo Cruz conta que nem 2% dos servidores eram negros ou pardos. “Em 2018 esse percentual já soma 11%”, comemorou.
Mato Grosso do Sul ainda conta com a Lei 5.206/2018, que instituiu o Dia do Orgulho Crespo. “Essa foi uma lei que criei para ser mais um dia de conscientização pelo fim do racismo, em todo 7 de novembro, data em que uma jovem de Nova Andradina, Karina Saifer de Oliveira, se suicidou aos 15 anos de idade após sofrer bullying na escola por causa do seu cabelo”, alertou o deputado Amarildo Cruz.
RACISMO DÓI
O deputado João Grandão também ressaltou a violência emocional que o racismo e a discriminação impõem. “É algo inadmissível, mas só quem passa, sabe o que significa a humilhação e a dor de sofrer pela cor da pele. Eu já passei e ficam traumas psicológicos. O racismo existe e ele dói”, lamentou o deputado.
João Grandão relembrou quando foi à África e viu os resquícios da política do Apartheid – segregação racial adotada entre 1948 e 1994 na África do Sul – em que as praias tinham portões e cachorros para proibir a ida de negros ao mar. “Quando foi liberado, muitos morreram por nunca ter tido a oportunidade de entrar na água e não souberam nadar. Essa situação de constrangimento e tantas outras nos pedem um momento de reflexão. A escravidão deixou uma dívida cultural, econômica e social com os negros”, finalizou o deputado.