As queimadas no Pantanal devem gerar impactos diretos e indiretos no bioma, incluindo falta de alimentos, desequilíbrio ambiental e risco de extinção de animais. É o que afirma um relatório do Instituto Homem Pantaneiro (IHP).
O documento foi anexado ao inquérito da Polícia Federal que investiga quatro fazendeiros por suspeita de iniciarem os incêndios que destruíram mais de 25 mil hectares do Pantanal, em Mato Grosso do Sul. O Instituto Homem Pantaneiro é responsável pela gestão de algumas reservas da Serra do Amolar, região considerada a mais preservada do Pantanal.
De acordo com o documento, assinado pela doutora em Ecologia e Conservação Letícia Larcher e pelo médico veterinário Diego Viana, os animais do bioma podem sofrer com a exposição de predadores, alteração de fauna, flora e alimentos, além de terem mudanças nos padrões de comportamento, migrações e na estrutura alimentar no ecossistema. Algumas espécies ainda podem ter o risco de extinção ampliado.
Larcher, que também é coordenadora técnica do IHP, explica que o Instituto recebeu um ofício da PF para ser anexado ao processo, pedindo algumas respostas sobre o Pantanal.
Segundo a doutora em Ecologia e Conservação, espécies de plantas podem deixar de existir por um período de tempo, já que cada ser vivo reage diferente após o fogo. “Por exemplo, uma espécie de planta pode demorar mais para responder quando a chuva chegar do que outras. Um animal que está associado a essa planta, vai precisar de ainda mais tempo para conseguir se adaptar ao local queimado”, explica Larcher.
A especialista aponta que a exposição a predadores de animais que vivem no Pantanal também aumenta após o fogo, já que a queimada deixa a superfície na mesma dimensão. “Se pegarmos uma cotia, por exemplo, que é um roedor que se esconde em tocas, quando essas tocas são destruídas pelo fogo, ele precisa criar locais novos para se esconder de predadores. Sem local para fuga, elas ficam mais suscetíveis a outros predadores que não os já naturais”, afirma.
Alterações nos alimentos, padrões de comportamento e migrações dos animais também devem ocorrer, conforme a coordenadora técnica do Instituto Homem Pantaneiro. “Quando o fogo destrói uma área grande, o conteúdo nutricional dos alimentos para a fauna fica prejudicado. Os animais que hoje procuram goiaba, por exemplo, que deveria estar florescendo, não conseguem achar e precisarão repor de alguma outra maneira”.
Larcher ainda aponta que a tendência é de que o Pantanal tenha uma alteração na estrutura trófica – com alteração nas cadeias alimentares – com a tendência de colonização por espécies invasoras.
“Se um animal perde sua base alimentar, ele vai procurar em outro local. Por exemplo, a onça, que se alimenta de cotias. As cotias precisam fugir para buscar uma nova alimentação e onde hajam tocas para se esconderem de predadores. A onça, sem alimento, vai precisar sair deste ambiente natural também, deixando o que era antes habitado por ela, para espécies invasoras. As mudanças de como as espécies se relacionam também é um efeito direto do fogo”, explica.
Por fim, alguns animais que já estavam em risco de extinção também devem ter o perigo ampliado devido ao fogo, conforme o documento encaminhado à Polícia Federal.
“O tamanduá-bandeira é um exemplo que está em extinção e é muito lento, com densa pelagem, muito suscetível ao fogo. Ele ainda se alimenta de formigas, que ficam no solo. Se o solo pega fogo, do que ele vai se alimentar e como ele vai sobreviver, sem a habilidade de locomoção?”, argumenta a especialista.