O tabuleiro da sucessão estadual começa a ganhar alguns contornos e revelar tendências sobre as possibilidades políticas e eleitorais de alguns de seus principais protagonistas. De todas as forças credenciadas para enfrentar um jogo tão pesado e de tamanha envergadura, o ex-governador André Puccinelli é, sem dúvida, quem desperta a maior curiosidade sobre seus projetos.
Alvo de diversos processos de investigação e denúncias de corrupção, que até já o colocaram em situações constrangedoras – ser obrigado a usar tornezeleira eletrônica e ter a sua casa revistada pela Polícia Federal, além do bloqueio de bens -, o peemedebista vem fazendo suspense sobre o que pretende fazer em 2018. Ele explora a polêmica para ganhar espaço político positivo teoricamente compensatório aos degastes que pesam sobre seus ombros desde que deixou o governo, em 2014, e passou a figurar entre as celebridades regionais mais citadas no cenário das suspeições.
AS FICHAS
As projeções lógicas dos observadores políticos experientes situam Puccinelli num campo de concorrência eleitoral que hoje tem como peça principal o governador tucano Reinaldo Azambuja, fortalecido pela visibilidade que seu desempenho vem alcançando até com repercussão nacional. Além de Puccinelli e Azambuja, o terceiro num eventual confronto entre os nomes mais competitivos para a disputa sucessória é o do deputado federal e ex-governador Zeca do PT.
Já se sabe, todavia, que Zeca decidiu ficar entre dois caminhos: concorrer a uma vaga do Senado ou buscar reeleição, tendo em vista o fato de conservar um prestígio político e pessoal que não sofreu o mesmo impacto da rejeição atribuída a diversas expressões políticas de seu partido. Para aspirar à chamada terceira via, as especulações trazem nomes como os do médico Ricardo Ayache (PSB), presidente da Cassems; do senador Pedro Chaves Filho (PSC); do juiz federal Odilon de Oliveira (sem partido); e do deputado federal Luiz Henrique Mandetta (DEM).
Ricardo Ayache dificilmente deixaria o controle absoluto de uma das instituições mais sólidas e financeiramente abonadas para aventurar-se numa disputa sem a certeza de ingressar com chances consideravelmente competitivas.
Pedro Chaves Filho, que ganhou a vaga senatorial como suplente do titular cassado, Delcídio Amaral, parece estar mais envolvido com a luta pela reeleição.
O magistrado Odilon de Oliveira não dá sinais convincentes de estar disposto a abraçar a aposentadoria levando nos braços a bandeira de candidato, sobretudo a cargos majoritários.
Assim, restariam hoje, entre certezas e dúvidas, as candidaturas de Azambuja à reeleição e Puccinelli, na tentativa de voltar. A certeza da candidatura de Azambuja é tão grande quanto a incógnita em torno do que vai acontecer com Puccinelli, porque os seus passos eleitorais não avançam enquanto estiver com a cabeça na guilhotina. Pendências judiciais, ainda que não traduzam sentenças definitivas, causam enorme estrago moral, político e eleitoral. Não por acaso, nos bastidores do poder prospera a convicção de que Puccinelli não será candidato, por um desses (ou todos) motivos: desgaste político e emocional com as denúncias, eventual condenação judicial em um de seus processos e o restabelecimento da plena força administrativa e eleitoral do governador Reinaldo Azambuja.
STAFF DE SUSPEITOS
A falta de dinheiro suficiente nas contas dos investigados da Operação Lama Asfáltica que a Justiça mandou bloquear causou estranheza esta semana. A 2ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos determinou o bloqueio de R$ 10,7 milhões de vários aliados e ex-assessores de André Puccinelli, mas nenhum deles tinha o total dos valores que a Justiça imobilizou. Na conta do ex-secretário de Obras e ex-deputado Edson Giroto, por exemplo, só havia R$ 14,70.
O fato trouxe muitas indagações e uma certeza: a de que o Ministério Público, autor das denúncias formais e pedidos de prisão, e o Judiciário, entre outros braços da força-tarefa que realizou a operação Lama Asfáltica, estão lidando com profissionais na arte de confundir e despistar as investigações. Quando esteve no poder (foi prefeito de Campo Grande e governador, em dois mandatos de cada cargo), Puccinelli se cercou de um time de aliados e assessores recrutados para operar dentro e fora da política. Parte desse staff hoje está no rol de suspeitos, denunciados pelo Ministério Público por vários crimes, de pagamento de fraude em licitação a formação de quadrilha e lavagem de dinheiro.
ESQUEMÃO
A Operação Lama Asfáltica – que teve mais duas etapas, a Fazendas de Lama e a Aviões de Lama – foi deflagrada em 2015 para apurar o desvio de verbas públicas em contratos de obras, serviços e compras patrocinados pelo governo de Puccinelli. O agente operacional mais importante do esquema, segundo a força-tarefa, é João Alberto Amorim, megaempresário que controlava a distribuição das principais obras públicas do Estado e de Campo Grande.
Além de Amorim, também faziam parte do grupo operacional de Puccinelli o ex-secretário Edson Giroto; o dono da Gráfica e Editora Alvorada, Mirched Jaffar Jr; o ex-secretário de Fazenda, André Cance; e o ex-prefeito de Paranaíba, Wilson Roberto Mariano de Oliveira. Em várias etapas dessas operações e intervenções judiciais aconteceram várias prisões, apreensões de aeronaves e veículos, bloqueio de contas e bens. Puccinelli teve que ficar alguns dias de tornozeleira.
A desenvoltura do esquema no desvio de recursos era tamanha que não existia muita preocupação com a coerência e o aspecto legal e técnico das transações. De acordo com a Controladoria-Geral da União, só em um mês a Gráfica Alvorada recebeu R$ 11,2 milhões do governo, sendo R$ 5,5 milhões no dia 30, penúltimo do mandato de Puccinelli.
Outro símbolo da gastança, do desperdício e do escoamento de verbas públicas pelo propinoduto no governo Puccinelli é o Aquário do Pantanal. A obra deveria custar cerca de R$ 70 milhões, porém já sugou mais de R$ 200 milhões dos cofres estaduais e ainda não foi concluída em cinco anos arrastados de serviços. Também ninguém sabe quando ou se ao menos será concluída.