A disputa presidencial no Brasil transformou-se numa encarniçada guerra entre os concorrentes. Ao menos oito deles se nutrem com a expectativa de ingressar no segundo turno, embora os números das pesquisas de intenção de voto sinalizam que são maiores as chances de quatro a cinco rivais. Com isso, não há garantias consolidadas de que algum dos concorrentes esteja com sua situação definida, embora restem apenas três semanas para a votação.
Sem a presença do ex-presidente Lula (PT), que teve a sua candidatura indeferida pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) por causa da sentença de segunda instância que o levou à prisão, o deputado federal Jair Bolsonaro (PSL) assumiu a ponta das intenções de voto em três das quatro principais pesquisas divulgadas até agora (Ibope, DataFolha. CNT/DMA e Vox Populi). Só uma delas, a da Vox Populi, mostra o petista Fernando Haddad em primeiro lugar, com Bolsonaro em segundo.
No entanto, o convencimento dos observadores sobre esses números indica que há uma tendência desenhada de que Bolsonaro seja quem mais se garante no segundo turno. E os demais – Haddad, Ciro Gomes (PDT), Marina Silva (Rede Sustentabilidade) e Geraldo Alckmin (PSDB) -, na média empatados se digladiam pela segunda vaga. Ainda correm na pista como elementos-surpresa outros três postulantes: João Amoedo (Novo), Álvaro Dias (Podemos) e Henrique Meirelles (MDB), com pontuações menores, mas amparados por estímulos concretos.
PRÓS E CONTRAS
Em que pese a liderança de Bolsonaro – um pouco acima dos 20% das intenções de voto – a alta rejeição (44%, segundo o Ibope), a maior entre os candidatos ao Palácio do Planalto, dificulta sua competitividade em eventual segundo turno. Prova disso é o fato de Bolsonaro perder para praticamente todos os concorrentes. No melhor cenário, estaria tecnicamente empatado com Haddad, numericamente à frente do petista.
Uma explicação para o crescimento de Ciro Gomes é sua proposta de limpar os nomes das pessoas que estão no SPC. Mesmo que tenha sido mal recebida pelos mais instruídos, uma parcela do eleitorado cedeu a ela. Alckmin, que tem 9%, também está tecnicamente empatado com Ciro e Marina. Vale destacar a posição de Amoedo. Mesmo sem tempo de TV, tem 3% das intenções de voto, superando numericamente Henrique Meirelles e tendo o mesmo porcentual de Álvaro Dias.
Para analistas do jornal ‘O Estado de São Paulo’, duas incógnitas podem mexer ainda mais no tabuleiro diante das seguintes indagações: 1) a campanha negativa do PSDB contra Bolsonaro funcionará?; 2) a transferência de votos de Lula para Haddad se intensificará? A tendência é o jogo ficar mais equilibrado nos próximos dias. Bolsonaro deve manter a liderança, mas Marina, Ciro, Alckmin e Haddad podem ficar ainda mais próximos. E Amoedo pode embolar ainda mais o cenário.
DEBATE
‘O Podcast Eleições’, programa semanal da Gazeta do Povo que analisa a sucessão presidencial, realizou na quarta-feira, 12, uma acurada avaliação sobre os impactos dos dois principais acontecimentos políticos dos últimos dias. Os jornalistas Lúcio Vaz, Renan Barbosa e Fernando Martins e o analista político e escritor Mario Vitor Rodrigues concluíram que a facada contra Bolsonaro e a desistência de Lula não “criaram” uma nova eleição, embora sejam elementos importantes na atual campanha. Isso porque a facada contra Bolsonaro não provocou, segundo as pesquisas eleitorais realizadas após o atentado, a comoção popular prevista por muitos analistas.
“Três pesquisas eleitorais realizadas após o ataque a Bolsonaro – BTG/FSB, Datafolha e Ibope – mostraram que o candidato do PSL consolidou a liderança nas pesquisas, com porcentuais entre 24% e 30% das intenções de voto. Mas ele não disparou, subindo entre 2 e 4 pontos porcentuais em relação aos levantamentos anteriores dos mesmos institutos”, avaliaram. Não foi levada em conta a pesquisa mais recente, do Vox Populi, a primeira a trazer Haddad na liderança.
POUCO EMBALO
Para os debatedores, alguns fatores podem explicar o crescimento moderado do candidato do PSL, apesar de ter sido vítima de um crime: Bolsonaro divide tanto as opiniões que não consegue comover quem pensa diferente. Muita gente acreditou na informação falsa de que houve uma simulação de atentado. E há um sentimento em parte do eleitorado de que ele “teve o que merecia” (reforçado, por exemplo, pelo gesto de Bolsonaro de se deixar fotografar, um dia depois da facada, simulando armas com as mãos).
Outra conclusão dos participantes do Podcast foi de que o impacto moderado do atentado nas intenções de voto de Bolsonaro tende a levar outros candidatos – sobretudo Geraldo Alckmin – a voltar a atacar o concorrente parar tirar-lhe votos de eleitores de centro-direita. Os debatedores concordaram, entretanto, que Bolsonaro tende a estar no segundo turno porque seus eleitores têm se mostrado muito fiéis. Mas, nessa fase da campanha, ele enfrentaria duas grandes dificuldades para se tornar o próximo presidente: a alta rejeição e seu estado de saúde.
No segundo turno, Bolsonaro ainda estará convalescendo do ataque, dificilmente participará de muitos eventos de campanha e pode passar uma imagem de fragilidade para o eleitorado. Com base no cenário atual, a principal aposta dos participantes do Podcast Eleições é de que o adversário de Bolsonaro no segundo turno será o petista Fernando Haddad – que tende a conquistar ao menos uma parte dos votos que seriam de Lula (num porcentual suficiente para levá-lo à disputa final).
Ciro Gomes (PDT), contudo, corre por fora no campo da esquerda e tem chance de tirar Haddad do segundo turno. Os dois, aliás, daqui para frente tendem a começar a trocar críticas e ataques. Essa possível “guerra” e a divisão da esquerda podem favorecer Alckmin – especialmente se ele conseguir tirar votos de Bolsonaro e dos demais concorrentes mais da direita e do centro: João Amoedo (Novo), Álvaro Dias (Podemos), Henrique Meirelles (MDB) e até mesmo Marina Silva (Rede).