Às vezes o grande é pequeno. Ou a grandeza se apequena. Para entender do que se trata, esta FOLHA traz ao seu publico de leitores e leitoras um exemplo, que pode ser chamado de protesto, indignação, inconformismo, revolta ou coisa que o valha.
Campo Grande é uma cidade que já no próprio nome demonstra as verdades sobre seu tamanho urbano, econômico, social e cultural, e avança na sua dimensão demográfica, aproximando-se da conta de um milhão de habitantes. Sustentado pela qualidade humana das pessoas que nele vivem, o município exibe grandezas que, infelizmente, não espelham as carências, entre elas a gravíssima deficiência na capacidade de atendimento hospitalar.
É difícil acreditar: com quase um milhão de domiciliados esta grande Campo Grande não tem seu próprio hospital. Sim, ela abriga unidades de excelência nosocomial, privadas (Santa Casa) e publicas, como o Hospital Universitário (da UFMS, da União) e o Hospital Regional (do Estado).
A rede existente dispõe de várias opções, porém insuficientes para responder à demanda que é crescente e se impõe 24 horas por dia. Mais uma vez vamos aos números: a cidade tem quase um milhão de habitantes, mas esta quantidade cresce muito na questão da saúde, pois os hospitais locais atendem pacientes exportados por outros municípios, estados e até países mais próximos.
Por isto, a indignação: se existem problemas sérios de atendimento, como o socorro clínico-hospitalar, porque esta grande cidade segue há mais de 120 anos tão pequena para oferecer ao povo uma garantia indispensável de vida e saúde? A resposta não socorre esta pergunta, feita década após década pelo povo. Porque a resposta é dos poderes públicos, Executivo e Legislativo, responsáveis pela construção de soluções desta natureza.
Enquanto nos hospitais e postos muita gente sofre horas, dias, meses e anos para ser atendida, vereadores que não priorizam as obrigações de fiscalizar o Executivo e fazer leis necessárias, descansam diante da luz das câmeras com projetos muitas vezes inúteis. Já deveriam ter procurado os meios para atender quem precisa e depende de hospital. Já deveriam ter ido aos governadores, aos prefeitos, aos parlamentares para ajustar soluções.
Nos anos 1980 o presidente do Previsul, médico João Jorge Chacha, acendeu a luz da melhor ideia: somar recursos para construção do Hospital Municipal. Ficou falando ao vento. De lá até cá, legisladores e executivos parece que fizeram ouvidos moucos. A Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2020 já alinhava nas prioridades uma despesa (investimento, na verdade) de R$ 200 milhões para a obra hospitalar.
Cadê esta projeção? O gato comeu? Falta dinheiro? Ao que se sabe, é obrigatório ao poder publico – está na Constituição – dispor de recursos para as maiores prioridades. E a vida não é artigo supérfluo. Campo Grande deve ser a única das capitais nesta condição.
O Executivo chegou a anunciar que investiria R$ 200 milhões nesta obra, que até hoje não tem cara, nem cor, tanto que o vereador Dr. Victor Rocha (PP) questionou informações que não foram dadas, como o local da construção e qual a fonte orçamentária (de onde virá o dinheiro, já que não há previsão na LDO em vigor). Ele é presidente da Comissão de Saúde, sabe o que está falando e, por mal que se lembre, não recebeu aparte algum dos colegas, contra ou a favor, elogiando sua fala ou criticando-a.
Dessa forma, na grande cidade que não tem seu próprio hospital, mais uma peste vem engrossar a coleção de epidemias que afetam a sociedade – uma peste chamada omissão, com pouquíssimos legisladores imunizados.