Os desatinos políticos neste Brasil são tantos e tão variados que inspiram nos críticos mais mordazes a retórica irônica. E os ditos populares são implacáveis: “malhar em ferro frio”, “casa de ferreiro, espeto de pau”, “subir em canoa furada”, “remar contra a correnteza”. Não desqualificam, talvez, mas reduzem o desatinado ou sua atitude ao rés do chão da ilógica, da insensatez, da desinteligência ou da incoerência.
Assim foi – insensato, desinteligente e incoerente – o discurso do vereador Júnior Coringa, líder do PSD na Câmara Municipal de Campo Grande, ao desfraldar a bandeira partidária de lançar em 2024 candidato próprio – ou candidata – à sucessão da prefeita Adriane Lopes.
É, de fato, um direito que o assiste, assim como assiste a todos os seus colegas de bancada que, ao menos em tese, lhe são obedientes. O PSD, em âmbito nacional, é um partido gigante, robusto, mas só medido assim pelo tamanho da representação política conquistada em diversos estados nas vitórias eleitorais de 2022.
Contudo, o PSD de Mato Grosso do Sul não faz parte do grupo de estados vitoriosos. Está na ponta oposta, a dos perdedores. O pior: uma derrota que, mesmo anunciada, veio acrescida de componentes que não se limitaram ao resultado numérico das urnas.
O pífio sexto lugar de Marquinhos Trad na disputa sucessória, sendo batido até por rivais de menor expressão eleitoral, teve a incômoda e pesada sobrecarga da revelação de desmandos nos seus cinco anos de mandato na prefeitura. Além disso, com o triste e vexatório espetáculo do palanque de um candidato que dormiu liderando as pesquisas e acordou sob incisivas dúvidas de ordem ética, quando foi denunciado por assédio sexual no exercício do cargo.
Por conta dessas diatribes, e embora estivesse concorrendo com candidaturas ao Governo, ao Senado Federal, à Câmara dos Deputados e à Assembleia Legislativa, o PSD caboclo naufragou. Ruidosamente. Fez um único eleito, o deputado estadual Pedro Pedrossian Neto. Nada mais. Poderia, pelo seu tamanho, pela força e poder que acumulou nos dois mandatos do prefeito, eleger outros pessedistas.
O discurso do líder do PSD, Júnior Coringa, ampara-se no direito jurídico-constitucional dado a uma vontade individual. E só. Porque é um direito amarrotado, comprometido pela falta de visão atualizada acerca da própria realidade e contaminado pela suspeita que desperta sobre os verdadeiros interesses que orbitam em torno desse projeto.
Infelizmente, para as valorosas forças que ainda permanecem nos seus quadros, o PSD de Mato Grosso do Sul afundou prematuramente. Está indo a pique, abalado por rombos administrativos e financeiros que são apurados e descobertos pela atual gestora.
E a prefeita Adriane Lopes só não naufragou junto porque é de outro partido, o Patriota. Todavia, sofreu e sentiu também a intensidade das dolorosas bordoadas daquele desgoverno, já que sua legenda sempre foi parceira do PSD e fiel ao prefeito que renunciou ao cargo para deixar seus companheiros sentados à beira do caminho ou navegando num barco furado.
Este é o cenário de terra arrasada no qual os vereadores pessedistas da Capital querem lançar os correligionários. Pode ser que logo comece a contar nos dedos quantos heróis e heroínas terá na tripulação. E não há salva-vidas para todos.