A rotina conflituosa de relações entre os poderes no Brasil tende a agravar-se e atingir um ponto de explosão, cuja maior prejudicada seria a população. Até parece que os gestores – notadamente o presidente da República – não têm olhar para a situação que criam. Ou que não têm sensibilidade.
É absolutamente legítimo e legalmente assegurado o direito de discordar de decisões dos ministros e magistrados do STF e do TSE. Não são intocáveis, muito menos inimputáveis. E são humanos, passíveis de erro. Contudo, a liberdade e o direito de contestação precisam ser exercidos nos limites que a Constituição define. E o Brasil tem uma Carta que é democrática, gostem ou não.
O que não se pode é extrapolar tais limites, como fazem o presidente e os seus seguidores fanáticos, que o seguem e investem como touros brabos contra os que a ele se opõem. Foi o que fizeram pessoas célebres, como o consagrado cantor e ex-deputado Sérgio Reis, ao convocar manifestações incitando à violência e ao quebra-tudo para garantir o propósito de ferir os tribunais e os ministros que estão em sua lista de malditos.
Os presidentes do Senado e da Câmara, ainda que calibrando o tom, deram a recomendação da serenidade e do entendimento. Bem ou mal, descompensam os graus elevados de beligerância, acesos por bolsonaristas que ameaçam com uma ruptura política e institucional para afastar a hipótese de serem reprovados pelas vias legais e institucionais da democracia, do voto.
Agora entram em cena os governadores, que até então haviam sido carimbados de vilania pelo chefe da Nação durante a crise do coronavírus. Chefes dos executivos estaduais têm autoridade política e popular para entrar em cena e contribuir com a pacificação dos ânimos e dos humores.
Todavia, é inadmissível que continuem sendo tratados de forma discricionária pelo Planalto, porque não há como conciliar a política brasileira e conferir sua estabilidade enquanto uma voz continuar destoando o coro e tirando a afinação que lhe daria o toque de harmonia.
O Brasil precisa do que não teve nestes últimos dois anos e meio: uma direção segura e serena, capaz e sensata, competente e dinâmica, e acima de tudo um olhar plural, grande no reconhecimento das diferenças e no respeito que deve ser tributado a cada uma.
Infelizmente, o dono da chave do cofre e da caneta mais poderosa da Nação parece que vive outra realidade, aquela que ele própria criou para se manter “acima de tudo e de todos”. E se esquece – ou desconhece – que o poder não é uma estrada reta. Há curvas para a derrapagem necessária ao encontro com a verdade. E a verdade dói.