Existem três tipos de pessoas neste mundo: aqueles que são os primeiros da fila para todos os filmes da Marvel, aqueles que se inclinam em direção a eles indiferentemente e aqueles que preferem ficar em casa e ouvir sertanejo sofrência ou assistir Grey’s Anatomy ou reorganizar seus armários de cozinha.
Viúva Negra é bom o suficiente, talvez, para merecer a atenção até mesmo daquele último grupo.
Trabalhando a partir de um roteiro de Eric Pearson (adaptado de uma história de Jac Schaeffer e Ned Benson, baseada, obviamente, em personagens da Marvel), a diretora Cate Shortland fez um filme que o convida a se preocupar com os personagens, em vez de apenas se preocupar com A franquia. Os atores parecem saber que estão nas mãos de alguém que sabe o que está fazendo; até mesmo as sequências de ação, fortemente bordadas com CGI, como quase todas as cenas de ação modernas são, mostram algum calor humano. Este é um filme que leva seu trabalho a sério, sem se levar muito a sério.
O filme começa com uma história de fundo, um idílio de infância: uma mãe, Melina (Rachel Weisz), prepara o jantar para sua família. Então, seu marido, Alexei (David Harbour), o pai das meninas, entra pela porta, taciturno. Seu dia ruim no trabalho dá início ao que será enquadrado como “uma aventura” para a família, envolvendo uma longa viagem – as garotas saem de casa tão de repente que a mais nova nem está usando sapatos – um avião de fuga escondido os levará a Cuba. A filha mais velha Natasha (Ever Anderson como Natasha jovem) tem alguma ideia do que está acontecendo, só que a mais jovem, Yelena (Violet McGraw como Yelena jovem) não tinha a menor ideia. Nos próximos minutos, as meninas serão arrancadas de seus pais – que, ao que parece, não são seus pais e, nada disso parece destinado a terminar bem; a sequência de abertura é tensa e intensa, remetendo aos medos da velha escola, de perda ou abandono dos pais.
21 anos depois, encontramos essas meninas novamente agora mulheres: a mais velha, Natasha Romanov (Scarlett Johansson), também conhecida como Viúva Negra, conseguiu se juntar aos Vingadores, embora ela esteja perdida agora. A história se passa durante o período em que as brigas internas dos Vingadores os fazem se separar. Já a sua irmã mais nova, Yelena Belova (Florence Pugh), foi durante anos uma assassina altamente treinada, sob o domínio do mentor do mal Dreykov (Ray Winstone). Mas Yelena foi recentemente libertada do feitiço de Dreykov – com uma poeira vermelha potente e especial que resolve o problema. Além disso, ela se ressente de todos, especialmente de Natasha, que tentou, mas não conseguiu protegê-la quando as duas eram crianças.
Mesmo estando “de bode”, Yelena decide se juntar a Natasha para derrubar o império de Dreykov. Essa missão as reúne com seus péssimos pais que não são de verdade seus pais, mas sim, indivíduos que só começaram a prepará-los para Dreykov anos atrás.
A dinâmica familiar rachada no centro de Viúva Negra é o seu melhor conceito e o mais simples – todo mundo adora uma família bagunçada na tela.
A Viúva Negra de Johansson sempre foi uma das super-heroínas mais legais: ela sempre pode e consegue lidar com as vilões sozinha e não precisa chamar o Homem de Ferro ou o Capitão América. Johansson sempre se sentiu sólida nesses filmes, ágil e decidida tanto em seus passos elegantes quanto no vibrato sedoso de sua voz, e ela sempre pareceu uma mulher a caminho de algum lugar mais importante. Aparentemente, esse lugar é este filme.
Se Viúva Negra seguisse o modelo padrão da Marvel de algumas maneiras básicas, ela se desviaria muito para deixarsua própria marca. Mas aqui, felizmente, estamos livres daquela bobagem de “Vingadores trabalhando juntos” e de todas as brigas fofas que vem com isso. Já as sequências de ação são tipicamente da Marvel em lógica visual, e inclusive, algumas são mais íntimas; e pelo menos atendem ao humor e às boas intenções das personagens ao invés de apenas tentar impressionar.
O melhor de tudo é que a Viúva Negra cria uma estrutura para mais informações da Yelena de Pugh. Em Viúva Negra sua fisicalidade vem acompanhada de um senso de humor aguçado. Mas Pugh nunca se esquiva da amargura de Yelena. Esta é uma jovem que, como parte do exército feminino de Dreykov, passou por uma histerectomia involuntária e agora ela só gostaria de relaxar e ter um cachorro. Ao interpretá-la, Pugh caminha em uma linha delicada entre a autossuficiência ranzinza e o desejo humano básico por toque e afeto.
A busca por algo aparentemente fora de alcance é o motor que mantém Viúva Negra girando.
5 pipocas!
Disponível no Disney+ (Premier Acess) e em cartaz nos cinemas (Cinemark, Cinépoliz e UCI).