A Energisa, concessionária exclusiva dos serviços de fornecimento de energia elétrica em Mato Grosso do Sul, zomba da paciência e dos direitos dos consumidores que lhe dão um dos mais lucrativos retornos no segmento de concessão privada do País. E passa da hora de sofrer os vários choques pertinentes: de responsabilidade, de justiça, de realidade, de vergonha.
Há três semanas o Tribunal de Justiça (TJMS), em uma decisão monocrática do desembargador João Maria Lós, acolheu um recurso da empresa e, em efeito liminar, suspendeu a perícia de 200 medidores de consumo que a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), da Assembleia Legislativa, tinha enviado para o Departamento de Engenharia da Universidade de São Paulo (USP) de São Carlos. O objetivo da CPI é investigar denúncias de abusos tarifários e de aferições irregulares de consumo.
A Energisa pediu a suspensão da perícia alegando, de má fé, que a CPI não havia se preocupado em calçar a solicitação de perícia com a acreditação do laboratório da USP junto ao Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro). Fosse uma alegação estribada na realidade, a CPI teria violado uma normatização federal da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).
Entretanto, a Energisa sabia ou, obrigatoriamente, por sua atividade, deveria estar sabendo que desde julho de 2019 as estruturas laboratoriais e de pesquisa daquela instituição universitária – o Instituto de Física de São Carlos (IFSC), a Escola de Engenharia de São Carlos (EESC) e o Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação (ICMC) da Universidade de São Paulo – são associadas à rede de Laboratórios Associados ao Inmetro para Inovação e Competitividade (LAIIC).
Seria por demais estranho se a Energisa de fato desconhecesse isso. Estaria então de posse de uma concessão irregular, por inapetência. Porém, não é difícil saber por qual motivo a concessionária entrou com o recurso. No mínimo, para barrar não apenas a perícia, mas todo o trabalho da CPI. A Energisa não quer de maneira alguma ter suas atividades escarafunchadas por uma comissão parlamentar de inquérito. E, diga-se de passagem, um colegiado muito bem presidido por um político combativo, determinado a levar essa investigação até o fim, o deputado estadual Felipe Orro.
A pedido de Felipe Orro, a Mesa Diretora da Assembleia Legislativa ingressou com dois recursos para responder no processo movido pela Energisa contra a CPI. Na verdade, como bem definiu Orro, o colegiado legislativo é que está em uma posição de ataque, e não o contrário. Um ataque para esclarecer – e para esclarecer é necessário ir a fundo nas investigações.
“Em um dos recursos que foram encaminhados ao presidente do Tribunal de Justiça, a CPI reivindica a suspensão da liminar para que possa dar seguimento à perícia nos medidores, considerada uma medida fundamental inclusive, se for o caso, até para isentar a própria concessionária. O que não podemos – nem nós, nem os consumidores – é ficar com essa dúvida permanente, já que as reclamações de consumo elevado sem
justificativa são muitas”, afirma Felipe Orro.
A CPI, portanto, traduz os sentimentos, as expectativas, o clamor por justiça e por responsabilidade que brotam da consciência de milhões de consumidores lesados, não-apenas pelas tarifas exorbitantes e extorsivas daquilo que consome, mas também por pagarem por serviços que não recebem, no caso da Contribuição de Custeio para os Serviços de Iluminação Pública, a famigerada Cosip.
A Energisa sustenta que todos os consumidores usufruem da iluminação pública porque circulam em todas as partes da cidade providas por este serviço. Este é um argumento sacana – esta grotesca definição é a melhor para aquilatar a desfaçatez de quem entende que o morador de um bairro sem rede de luz nas ruas está obrigado a custear por um serviço que só o beneficiará se sair de casa para ir, por exemplo, até o centro da cidade. Se esta pessoa não sair e viver às escuras em seu bairro, ainda assim continuará obrigado a pagar pela iluminação pública, por um bem que não recebe.
Cara de pau é pouco Energisa!