Graduado em Educação Física pela Universidade Federal (UFMS) e mestrado na mesma especialidade acadêmica pela Unicamp, especialista em Treinamento Desportivo pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-MG), Marcelo Miranda é um dos mais destacados interlocutores de políticas públicas para o esporte.
Criador do primeiro curso de Bacharelado em Educação Física na UCDB (Universidade Católica Dom Bosco), coordenando o grupo de pesquisas do Laboratório de Aptidão Física por 15 anos, foi convidado pelo governador Reinaldo Azambuja (PSDB) para o desafio de inovar e fazer a política pública esportiva dar o maior salto na história da Fundação de Esporte e Lazer (Fundesporte).
Nesta entrevista exclusiva à FOLHA, o dirigente – que é membro do Conselho Federal de Educação Física – fala sobre os avanços da gestão e o impacto da crise do coronavírus na agenda de eventos e ações deste exercício. Miranda atribui o sucesso da sua gestão ao comprometimento do governador e aos passos construídos junto com a comunidade e lideranças – só um dos programas da Fundação atende 72 municípios, dentro de uma planilha com mais de 800 projetos, 500 professores e 29 modalidades esportivas.
FOLHA DE CAMPO GRANDE – Mato Grosso do Sul vem escalando degraus importantes no cenário nacional. Quais os principais avanços de gestão que explicam esta projeção?
MARCELO MIRANDA – Avançamos em praticamente todos os pontos elencados como prioridades pela comunidade esportiva. Um parêntese importante: as prioridades são decididas em nossa gestão por uma equipe, seguindo as diretrizes que o governador determinou e ouvindo a comunidade esportiva. Isso nos deu muita segurança pra trabalhar. Acredito que o principal avanço foi a democratização do acesso aos recursos e aos programas do governo do Estado. Hoje temos ações em praticamente todas as cidades.
FCG – O que falta para o Estado se consolidar como centro de referência e importância nos esportes?
MM – O grande desafio continua sendo a infraestrutura esportiva. Encontramos, em 2015, no Estado inteiro, uma situação de sucateamento dos ginásios, clubes e praças esportivas. Mato Grosso do Sul ficou fora dos grandes projetos do governo federal no ciclo olímpico antes de 2015. Mesmo com um atraso muito grande nessa questão e com toda crise que encontramos, já avançamos bastante, reformando diversos ginásios. Hoje este é o ponto-chave: Temos profissionais altamente qualificados, um amplo programa de iniciação esportiva, um programa de bolsa que é referência nacional… Só nos falta estrutura adequada.
FCG – Como se torna possível fomentar e massificar nos municípios as culturas e práticas do esporte pelo conceito da inclusão?
MM – O programa mais relevante que criamos, de desenvolvimento esportivo, está presente em 72 municípios. São mais de 800 projetos com mais de 500 professores e 29 modalidades esportivas, várias delas do paradesporto. A identificação de talentos é um dos objetivos, mas o principal é democratizar o acesso ao esporte, a massificação. Também damos suporte às prefeituras e temos tratado desse tema em todos os nossos fóruns, para conscientizar os gestores municipais que o esporte é uma política pública essencial e que a relação custo-benefício é impressionante. Não tem outra estratégia de política pública que seja mais transversal. Quando se investe no esporte, os prefeitos estão entendendo que certamente colherão resultados significativos na educação, na saúde, na segurança pública.
FCG – Existe a ambição de projetar o Estado nos esportes de alto nível, formando técnicos e atletas para competições como as Olimpíadas?
MM – O esporte tem duas dimensões interessantes, que por muito tempo foram vistas, equivocadamente, como conflitantes, o que não é verdade, numa visão moderna elas se complementam. A primeira é a necessidade de massificação. Devemos ampliar o número de praticantes, tenham ou não aptidão privilegiada. É democratizar o acesso à prática esportiva. A segunda é identificar os talentos esportivos, abrindo oportunidades para que cresçam no esporte e transformem suas vidas e de seus familiares. Atuamos firmemente nas duas dimensões. Massificamos e democratizamos o acesso a programas esportivos no estado todo, dando condições aos nossos talentos com a qualificação de nossos técnicos, incentivo às federações e apoio direto por meio da bolsa a técnicos e atletas de ponta. O que mais precisamos agora é fortalecer os clubes, fundamentais no processo. É nossa grande meta a partir de agora.
FCG – Antes da pandemia do coronavírus havia uma agenda de eventos, entre as quais uma etapa da Liga das Nações de vôlei. O que mudou nas agendas?
MM – Lamentavelmente, no melhor momento da nossa agenda fomos atingidos pela pandemia. Mato Grosso do Sul se tornou um centro de grandes eventos esportivos nos últimos anos. Havíamos programado competições para entrar na história. A Liga das Nações de vôlei, trazendo pra Campo Grande os melhores países na modalidade, e os Jogos Escolares Nacionais, que envolvem sete mil atletas durante 15 dias, lotando os hotéis e restaurantes, proporcionam à população grandiosos espetáculos.
O cenário está incerto, mas se não for em 2020 certamente conseguiremos fazer no ano que vem.
FCG – Além da reforma do Guanandyzão há projetos de investir mais na melhoria e modernização da rede de espaços esportivos,
MM – Temos um programa especial de recuperação da estrutura esportiva. Já conseguimos um milhão e meio de reais do governo federal. Com esses recursos mais os que o governador disponibilizou, faremos mais obras de reforma e modernização, a começar pelo Morenão, esse grande patrimônio. Desde 2015 estamos lutando para devolvê-lo à população, não só para o futebol, mas torná-lo um centro de cultura e grandes acontecimentos.
FCG – A política de incentivo a atletas e corpo técnico, que inclui a concessão de bolsas, vai ser muito afetada pela crise decorrente da pandemia?
MM – Este momento é de muitas incertezas, sobretudo na questão econômica. Porém, o governador Reinaldo Azambuja, desde que assumiu, encontrou uma situação fiscal muito desfavorável e mesmo assim nunca faltou apoio ao esporte. Ele conhece o poder de transformação social que o esporte tem. Então, eu creio na sua capacidade de enfrentar as crises e na sua visão moderna de gestão.
FCG – Além dos projetos para os estudantes e atletas de competição, a Fundesporte também alimenta a prática de esportes junto aos idosos e outros segmentos. Como é feita esta inserção?
MM – Resgatamos os jogos da melhor idade e a cada ano a participação cresce de forma impressionante. Isso graças à qualidade na realização dos jogos e no programa de qualificação que disponibilizamos a todas as prefeituras, capacitando os profissionais para trabalhar com segurança nessa faixa etária tão importante. Esse recorte demonstra a importância do esporte como política pública essencial. Quando incentivamos os idosos a praticarem esporte com segurança, impactamos diretamente na saúde física e mental. Com o avanço mundial das doenças crônico-degenerativas e psicossomáticas, não existe sistema de saúde que dê conta de atender a população se não aprimorarmos programas que tirem as pessoas do sofá, combatendo os males do envelhecimento sedentário.
FCG – Quais as modalidades de maior procura e as de melhor condição de formar representantes locais para competições nacionais e internacionais?
MM – Mato Grosso do Sul tradicionalmente se destaca em várias modalidades, como o vôlei, o judô, a natação, o atletismo. Mas percebemos a cada dia o surgimento de atletas de destaque em outras modalidades e nas diversas regiões. Exatamente por isso os princípios básicos da nossa gestão são: transparência e democratização do acesso aos recursos e programas da Fundesporte.