Não se pode afirmar que, pelos resultados visíveis por todos até agora, a operação de matemática administrativa sob responsabilidade de dois governos – um municipal, outro estadual – em Campo Grande não é conta de somar. Pode ser de dividir: de um lado, o do Estado, está a parte que acrescenta materialmente os componentes de progresso humanista, urbano, ambiental, enfim, de avanços significativos.
De outro lado, o do Município, as características de maior visibilidade são a ausência, a omissão e o despreparo do poder público para responder às exigências da sociedade. Se não atende sequer as demandas mais elementares, como manter médico plantonista no plantão da unidade de saúde, não haverá de ter muito menos o talento e a competência para assumir desafios mais complexos, como a organização do trânsito, o reordenamento urbano, a política tributária, entre outros.
Não cabe agasalhar nesta análise a insinuação que já circula nas ruas de que são gestões em rota de colisão. Isto não é verdade. Governador e prefeito convivem dentro de uma perspectiva de parceria produtiva. No entanto, os resultados ainda não podem ir além do que está indo – é só um parceiro que produz, servindo ao outro, socorrendo-o nas urgências e nas necessidades que se manifestam por intervenções de curtíssimo, de médio e de longo prazos.
Se não é rota de colisão, é rota de contradições. Constata-se que em várias de suas decisões o prefeito se contradiz e age como se na campanha eleitoral fosse outro o vendedor de promessas e no cargo passou a ser estoquista delas. E parece que o estoque de promessas não cumpridas está bem sortido.
Quem havia dito que se preparou durante 20 anos para administrar a cidade em que nasceu ainda não demonstrou o que aprendeu. Ou desaprendeu. Enquanto a palavra dada não for honrada, a comunidade não terá outro julgamento a fazer se não o de que foi vítima de um estelionato eleitoral. Aí estão o caos na saúde, as trapalhadas de uma equipe que sofre com a falta de gestão, os erros primários em projetos de engenharia de simples execução, a diferença abismal entre o lote de investimentos estaduais e federais para a raquítica contabilidade das obras chanceladas pela Prefeitura.
Ninguém em sã consciência pretende voltar aos dias longos e dolorosos daqueles quatro anos que precederam a vez do atual gestor. Contudo, descontados os exageros de praxe, já há quem avalie que sentir saudades daquele passado é um sentimento natural ao deparar-se com a realidade do presente. Um presente sem futuro, a ponto de suscitar a gozação de ontem, agora transportada para expressar o sentimento de hoje: cadê o Bernal?
Que o prefeito perdoe os gozadores. É uma forma de expressar a decepção, a dor e o desalento de quem sai de casa de manhã e retorna à noite, pelas ruas escuras do bairro, com o gosto amargo de pagar por um serviço de iluminação pública que não tem ou de saber que, se adoecer, corre o risco de ter a saúde agravada porque vai correr para uma fila do SUS na dúvida se terá o tal do pronto atendimento ou se o plantonista estará à disposição.
Campo Grande não pode continuar mais sendo a cidade do “já foi”, do “já era”. É uma das mais importantes capitais do País. Já esteve entre as mais belas e mais bem cuidadas. Passou a ser uma das mais esburacadas. Transformou-se num poço vazio de esperanças. E é absoluta e totalmente refém de uma crônica dependência da atenção, da boa-vontade e da generosidade socorrista dos governos federal e estadual.
Tudo seria diferente se a competência, a humildade e a estratégia de gestão fossem comuns aos parceiros que atuam na capital de Mato Grosso do Sul. Mais da metade do mandato do prefeito já passou. Restam ainda 21 meses. Pode ser que seja ainda o tempo suficiente para o gestor assumir de fato que é um gestor, que tem palavra hipotecada na conta da confiança popular, que tem responsabilidade com o futuro se não espingardear o presente. Pode ser. E também pode não ser.
GERALDO SILVA