Investigações apontam que procurador pediu favor a desembargador, com o intuito de adiar pagamento; entenda
Investigações da Polícia Federal e da Receita Federal apontam que a negociação de uma liminar com intuito de adiar o pagamento de uma dívida de R$ 5 milhões, é o que liga o procurador de Justiça do MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul) Marcos Antônio Martins Sottoriva ao suposto esquema de compra de sentenças envolvendo desembargadores do TJMS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul).
Conversas entre Sottoriva e o desembargador Marcos Brito, afastado de suas funções na quinta-feira (24), após a Operação Ultima Ratio ser deflagrada, em Campo Grande e outras três cidades brasileiras, revelam acordo entre as duas partes.
Apesar de não citar um possível pagamento pelo acordo, documento obtido pelo Primeira Página classifica as mensagens trocadas e o favor concedido pelo desembargador ao procurador como “fatos bastante graves”.
“A nosso ver, fica claro que o desembargador profere indevidamente decisão favorável ao procurador de justiça em razão do cargo dele”, diz parte do documento.
Trechos da conversa entre os citados, em março de 2020, apontam que Sottoriva encaminhou a Marcos Brito o número de um recurso de agravo de instrumento contra decisão de 1º grau que indeferiu liminar em processo ajuizado por ele a respeito da compra de uma fazenda, com valor da causa de R$ 5 milhões.
Sem ter acessado aos autos, o desembargador pede a seu assessor para providenciar a elaboração de decisão liminar, concedendo os efeitos pretendidos, sem entrar no mérito, e assinar a decisão.
Ainda segundo as investigações, efeitos pretendidos em liminar eram:
- 1) a suspensão da exigibilidade das parcelas vincendas da fazenda comprada pelo procurador de justiça;
- 2) a manutenção dele na posse do imóvel rural, até a devolução dos valores que pagou;
- 3) suspensão do pagamento de aluguéis, pelo procurador, quanto a imóvel que entregou como parte do pagamento, mas que continua em sua posse, ou autorizar que deposite os aluguéis em juízo;
- 4) devolução, ao procurador, da posse de outros 3 imóveis que entregou como parte do pagamento, ou que os réus depositem os aluguéis em juízo.
Em mensagens entre o desembargador e seu assessor, Brito pede para que o funcionário assine a decisão, o que torna a ação ainda mais grave, já que quem assina a decisão não é o desembargador.
“Isso, a nosso ver, leva a uma grave conclusão: o desembargador não acessou os autos, não elaborou a decisão, não a conferiu e nem assinou. Portanto entendemos que a decisão judicial é nula, sendo que a atuação dele limitou-se a uma ordem a seu assessor que favorece indevidamente um procurador de justiça”.
No dia 9 de abril daquele ano, Sottoriva envia novas mensagens a Marcos Brito. “Graças a Deus e ao seu trabalho … acabamos por fechar um acordo … consegui alongar a dívida em mais uma parcela. Obrigado de coração. Boa Páscoa na bênção de Deus e de seu filho Jesus Cristo”.
Para a investigação, o recado em agradecimento demonstra que o desembargador proferiu decisão judicial em favorecimento indevido em razão do cargo de uma das partes.
Sottoriva foi alvo de mandado de busca e apreensão, cumprido em sua casa.
A reportagem procurou o MPMS pedindo um posicionamento sobre a citação do nome do procurador de Justiça no esquema investigado, que informou não ter recebido qualquer comunicação oficial dos órgãos de investigação, até o momento.
O espaço segue aberto para a defesa dos citados.